Edição nº 573

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 02 de setembro de 2013 a 08 de setembro de 2013 – ANO 2013 – Nº 573

Telescópio


Ação humana força animais
a ficarem mais espertos

Alguns mamíferos vêm ficando mais espertos para sobreviver num mundo dominado pela espécie humana, sugere estudo realizado por pesquisadoras dos Estados Unidos e publicado no periódico Proceedings of the Royal Society B. Emilie Snell-Rood e Naomi Wick mediram os crânios de exemplares de dez espécies, como ratos e morcegos, em esqueletos coletados ao longo dos últimos 100 anos em Minnesota. O resultado foi de que, em seis espécies – duas urbanas e quatro rurais – a capacidade craniana, o volume que acomoda o cérebro, aumentou no período.

As autoras usam capacidade craniana como um modo indireto de medir a “plasticidade comportamental” – a capacidade do animal de adaptar seu comportamento a situações novas. A tese original das autoras era de que os animais urbanos teriam um ganho de capacidade craniana maior que os rurais ao longo do período analisado, mas isso só se confirmou em duas das dez espécies estudadas. Mesmo assim, as autoras concluem que o aumento deve ter sido estimulado pelas pressões evolutivas do ambiente urbano, criado pelo homem.

No caso do aumento da capacidade dos animais rurais, as pesquisadoras ponderam que a paisagem rural de Minnesota também foi amplamente modificada pela ação humana nos últimos cem anos, com a destruição de florestas pela atividade madeireira e a conversão de matas nativas em terra agrícola.

O aumento pronunciado na capacidade craniana de mamíferos urbanos, em comparação com os rurais, aconteceu em espécies com alta taxa de fecundidade, diz o artigo, que cita uma série de estudos anteriores “consistentes com a ideia de que espécies capazes de grande reprodução podem mostrar uma resposta evolucionária mais pronunciada em ambientes urbanos”.

Buraco negro no centro da
Via-Láctea joga comida fora

No centro de nossa galáxia, a Via-Láctea, reside um buraco negro com massa quatro milhões de vezes maior que a do Sol. Conhecido como Sagitário-A*, ele cresce devorando gás das estrelas apinhadas a seu redor – mas, de acordo com uma série de observações, faz isso de modo muito ineficiente.

Um efeito colateral da atividade alimentar dos buracos negros gigantes, que habitam o coração de galáxias, é a emissão de raios-X. Mas a radiação produzida por Sagitário-A* é muito menor – cem milhões de vezes menor – que a esperada.

Em artigo publicado na edição de 30 de agosto da revista Science, um grupo internacional de pesquisadores, encabeçado por Q.D. Wang, da Universidade de Cambridge, usa dados levantados pelo observatório orbital Chandra de raios-X para oferecer uma explicação: de acordo com eles, a maior parte do gás que gira ao redor do abismo espacial nunca chega a cair nele e, em vez disso, é ejetada, num processo que se vale da própria energia que o buraco negro transmite às partículas. Com isso, apenas 1% da massa inicialmente atraída realmente chega ao interior de Sagitário-A*.

Mais de 50% dos artigos
científicos já são gratuitos

Relatório elaborado pelo grupo canadense Science-Metrix a pedido da Direção Geral de Pesquisa e Inovação da Comissão Europeia, órgão executivo da União Europeia, diz que cerca de 50% dos artigos científicos publicados em periódicos com revisão pelos pares tornam-se disponíveis gratuitamente até dois anos após sua aparição original.

Esse resultado representa mais que o dobro das estimativas anteriores da proporção da literatura científica em livre acesso, que geravam números da ordem de pouco mais de 20%. De acordo com o trabalho do Science-Metrix, já estão disponíveis gratuitamente a maior parte dos artigos que tratam de ciência pura, pesquisa biomédica, biologia, matemática e estatística. O campo no qual o acesso livre é mais restrito é o das humanidades e ciências sociais, e no das ciências aplicadas, como engenharia. O setor no qual há menos abertura é o das artes visuais (apenas 13% de artigos disponíveis gratuitamente), seguido pelo de comunicação e estudos textuais (21%).

O relatório aponta ainda que o crescimento mais intenso tem ocorrido nas publicações do chamado “padrão ouro”, onde o artigo se torna disponível no ato da publicação, geralmente financiada pela mesma instituição que custeou a pesquisa. O crescimento no chamado “padrão verde”, quando o trabalho é liberado após um intervalo de embargo, e os custos de publicação cabem à editora do periódico, tem sido menor. Os autores especulam que o descompasso detectado pode ser um efeito artificial, causado pelos longos períodos de embargo.

O trabalho canadense foi criticado por outros estudiosos da área, ouvidos pela revista Science. Autor de um artigo sobre o assunto publicado no periódico de livre acesso PLoS, que encontrou uma taxa de livre acesso de 20%, Bo-Christer Björk disse que a metodologia usada não lhe permite considerar a taxa de 50% “convincente”.

O verdadeiro
valor do dinheiro

Dinheiro é o que permite que pessoas que não se conhecem cooperem entre si dentro de grupos humanos muito grandes, diz artigo publicado no periódico PNAS. Assinado por pesquisadores dos Estados Unidos, Suíça e Itália, o trabalho tem como título Money and trust among strangers (“Dinheiro e confiança entre desconhecidos”).

Os autores especulam que, se a cooperação nas sociedades humanas evoluiu com base na interação de pessoas que viviam em pequenos grupos e se encontravam cara a cara, “há uma questão aberta sobre o quê permitiu que os humanos obtivessem sucesso em tarefas de cooperação envolvendo milhões de indivíduos”.

Para explorar o problema, os autores criaram um experimento no qual alguns participantes eram “produtores” e outros “consumidores”. A cada rodada, o produtor poderia optar por dar um presente ao consumidor, ou não fazer nada. Os papéis eram trocados aleatoriamente a cada nova interação, o que em tese deveria estimular doações, já que os papéis de produtor e consumidor poderiam inverter-se a qualquer momento.

Num dado momento do experimento, os pesquisadores incluíram uma “pedrinha”, que o consumidor poderia usar para “comprar” o presente. O resultado encontrado foi de que a troca espontânea de presentes tendia a diminuir à medida que o tamanho do grupo de voluntários aumentava – o máximo testado foi de 32 – mas que a opção de “comércio” era estável mesmo em grupos grandes. “Nossa pesquisa sugere que regras de cooperação voluntária são difíceis de usar numa sociedade de desconhecidos, a menos que mediadas por uma instituição”, escrevem os autores. “No experimento, a troca monetária (...) deu sustentação a um nível de cooperação estável em grupos grandes e pequenos. Pedrinhas sem valor intrínseco agiram como catalisadores de cooperação”.

Pesquisadores criam miniaturas do
cérebro humano com células-tronco

Pesquisadores da Áustria e do Reino Unido anunciaram, na edição de 29 de agosto da revista Nature, a produção de culturas de células organizadas em três dimensões que recapitulam os estágios do desenvolvimento do cérebro humano. Criados a partir de células-tronco de pluripotência induzida – fabricadas sem o uso de embriões – os chamados “organoides cerebrais” são descritos, num comentário publicado na mesma edição da revista, como “miniaturas, do tamanho de ervilhas, do tecido do cérebro humano em desenvolvimento”.

O autor do comentário, Oliver Brüstle, da Universidade de Bonn, na Alemanha, acredita que “para as perguntas certas, os organoides cerebrais poderão fornecer um modelo reducionista com o qual estudar o mecanismo do desenvolvimento inicial do cérebro humano, nas condições controladas de uma placa de laboratório”.

Os autores do estudo, encabeçado por Madeline Lancaster, da Academia Austríaca de Ciências, usaram, para criar as células-tronco que deram origem aos organoides, células da pele de um portador de microcefalia genética, uma doença que faz com que o cérebro tenha um tamanho significativamente menor que o normal. Quando os cientistas compararam os organoides desse paciente com outros criados a partir da pele de pessoas saudáveis, viram algumas diferenças no processo de formação dos neurônios.

Cientistas dos EUA tendem a
exagerar resultados, diz estudo

Uma análise estatística de mais de 1.100 pesquisas sobre genética, hereditariedade e psiquiatria indica que os estudos realizados nos Estados Unidos, ou que têm coautores americanos, tendem a informa efeitos mais contundentes do que os esperados pela média dos trabalhos que investigam os mesmos assuntos, o que sugere que a taxa de sucessos na literatura produzida pelos americanos pode ser exagerada.

Esse “efeito USA” é mais marcante nos estudos que envolvem parâmetros comportamentais – isto é, onde o resultado não depende apenas de quantidades que podem ser medidas diretamente, como a concentração de moléculas numa amostra de sangue, mas também da observação e avaliação do estado do paciente ou voluntário pelo pesquisador. “Os resultados são melhor explicados como efeito da interação entre a força das expectativas do pesquisador e o grau de suavidade do campo (isto é, baixo consenso metodológico e alta complexidade do tema)”, escrevem os autores da análise, Daniele Fanellia e John Ioannidis, publicada no periódico PNAS. Eles sugerem ainda que o efeito é especialmente pronunciado nos Estados Unidos por conta da pressão exercida pelo sistema de “publique ou pereça” que vigora no país.