Do ProFIS à graduação: os primeiros 16 formandos

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O Programa de Formação Interdisciplinar Superior (ProFIS) festejou no início deste ano seus primeiros graduados. Foram 16 estudantes selecionados em 2011 e 2012, de escolas públicas das mais diversas regiões de Campinas, que cursaram os dois anos do ProFIS, ingressaram na graduação e se formaram nas licenciaturas e bacharelados que elegeram. Entre os cursos estão Enfermagem, Fonoaudiologia, Pedagogia, Letras, Administração, Gestão de Comércio Internacional, Economia, Biologia, Esportes e Artes. Muito além das conquistas individuais, esse grupo imprimiu mudanças significativas dentro e fora da Universidade e apontou caminhos para transformações sociais mais amplas.

“Esses alunos são agentes transformadores. Não mudam apenas sua própria vida, mudam o entorno em que eles vivem. E estão mudando a cara da Universidade”, afirmou a professora Mariana Nery, coordenadora do Programa, em entrevista ao Portal da Unicamp.

Segundo a Pró-reitora de Graduação da Unicamp, Eliana Amaral, um dos principais diferenciais do ProFIS é seu modelo de cota geográfica, que garante vagas para todas as escolas públicas da cidade de Campinas. “Garantindo a representatividade de todo o território temos um perfil de estudante muito mais parecido com a realidade do mundo fora da universidade”, explicou. Mas ressalta que o mérito também é componente fundamental na seleção, tendo em vista que o critério de avaliação são as notas do ENEM. Ao final de cada ano, são ofertadas vaga aos candidatos com maior nota de cada escola e respeitando o limite máximo de dois alunos por escola. “Essa estrutura permite a inclusão de bairros muito distantes, onde as pessoas nem sabem que a Unicamp é uma universidade pública, e que se pode estudar aqui”, destacou Mariana Nery.

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Origem dos 16 alunos do ProFIS que se formaram na graduação 

Felipe Roberto Francisco, que acaba de concluir a graduação no Instituto de Biologia (IB) e ingressou no doutorado direto sob orientação da professora Anete Pereira, conta que em seu bairro ninguém havia cursado uma universidade pública antes dele e a Unicamp para comunidade se resumia ao Hospital de Clinicas (HC). “As pessoas nem sabem que existe universidade pública e gratuita na escola pública, onde a universidade pública deveria realmente estar agindo. Quando falava que estava na Unicamp, o pessoal achava que eu estava doente no hospital. Esse é um diferencial do Profis, aproximar a sociedade de verdade com seus bairros da periferia, da universidade pública”, explica Francisco. Estimulados por ele, dois amigos prestaram vestibular no ano seguinte e entraram na Unicamp.

Dentro da Universidade, os egressos do ProFIS se destacam em seus cursos por uma postura crítica e socialmente engajada. “Na última reunião de avaliação de curso do Profis, estavam praticamente todos os alunos matriculados. O nível de maturidade deles era surpreendente, difícil ver em outros cursos da Unicamp. Discutiram os problemas de cada disciplina, da sequência de disciplinas no semestre e fizeram propostas de melhorias para o curso”, relatou Ana Maria Carneiro, pesquisadora do Neep dedicada à avaliação permanente do ProFIS.

Eliana Amaral
Pró-reitora de Graduação da Unicamp, Eliana Amaral

Para além da sala de aula, estes estudantes têm marcado presença nas instâncias representativas da universidade como o Conselho Universitário e Centros Acadêmicos e em projetos de Extensão como o Ciência e Arte nas Férias, o Ver o SUS e o Projeto Rondon. Bárbara Cardoso Miranda, que se formou em Fonoaudiologia, contou como articulou professores e colegas de diversos cursos para participar do Projeto Rondon, em 2017. Selecionado, o grupo foi a Silvanópolis, uma cidadezinha em situação de extrema pobreza, no Tocantins. “Ficamos lá aproximadamente 20 dias com aquela população, ensinando o que a gente sabia”, relatou Bárbara.

Da mesma forma, Talita Rodrigues, graduada em Enfermagem, teve sua iniciação científica transformada em projeto de extensão. A pesquisa iniciada no segundo ano de ProFIS sobre “O risco de transmissão de hepatite B e C em clínicas de estética e salão de beleza, por conta do processamento inadequado dos instrumentos perfuro-cortantes” teve continuidade na graduação, com apoio da bolsa do Pibic. Como desdobramento, sua orientadora, Maria Isabel Pedreira de Freitas, montou um projeto de extensão, que realizou um curso sobre o tema manicures de Campinas na Unicamp. “Para mim sempre foi muito importante trazer as pessoas para dentro da universidade e levar o conhecimento que a gente produz aqui para fora. A experiência de fazer uma iniciação científica e depois poder ver a pesquisa como algo para a sociedade, através do projeto de extensão, foi muito bacana.” 

Mariana Nery
Mariana Nery, coordenadora do ProFIS

Dois anos no ProFIS

Durante os dois anos do ProFIS, os estudantes têm disciplinas como Ética, Matemática, línguas, tecnologia da informação, corpo humano e comunicação, arte, cultura e sociedade. “As aulas de ética que eu tive no ProFIS, eu não tive na minha graduação e eu sinto falta”, contou Bárbara. “A mudança que essas disciplinas causam na gente é muito grande. Abrem a nossa mente e nos ajudam a desenvolver uma visão crítica do mundo e política das coisas. Existe um antes e um depois do ProFIS”, afirmou Talita.

Para Francisco a disciplina de Evolução foi ao encontro de uma paixão de infância. “Eu sempre achei muito bonita essa ideia de que os organismos não foram sempre assim, simplesmente e para sempre. De que eles se adaptaram ao ambiente e se diferenciaram”, explicou o estudante. Este ano, Felipe começa seu doutorado onde continuará o mapeamento cromossômico de uma população de seringueiras visando melhoramentos genéticos que começara na iniciação científica. “Vou colocar os marcadores e dizer onde está cada cromossomo”, explicou Francisco.

“Eu estava no laboratório desde o primeiro ano da graduação, o que é raro. Se não fosse minha passagem pelo ProFIS, eu não teria esse começo”, contou. A iniciação científica, obrigatória no segundo ano do ProFIS, é apontada pela pró-reitora de graduação da Unicamp como um dos principais diferenciais do programa “A iniciação científica desde o começo, no ProFIS, faz toda a diferença. O estudante aprende desenvolver um pensamento científico e é esse pensamento que vai influenciar toda sua formação”, pontuou.

Ao mesmo tempo, durante os dois anos de ProFIS os estudantes aprendem a lidar com a vida universitária. “No primeiro ano da graduação vemos nossos colegas passarem pelas mesmas dificuldades que passamos no primeiro ano do ProFIS. E foi interessante, pois a gente pode ajudar”, contou Barbara.

 “Acredito se eu tivesse entrado direto no curso de graduação na Unicamp não conseguiria permanecer. Nos dois anos do ProFIS, temos tempo de você amadurecer”, afirma Talita. O amadurecimento se dá em diversos níveis e influencia profundamente a escolha da carreira. “O ProFIS permite aos alunos experimentar todos os aspectos da Universidade antes de decidir a graduação vai escolher. Vão fazer disciplinas de todos os institutos e quase todas as faculdades. Isso faz com que eles realmente consigam tomar uma decisão com muito mais certeza”, enfatiza a coordenadora do curso.
 

DepoimentosBárbara Cardoso Miranda

Eu era a única na turma que queria estudar

Barbara Cardoso Miranda

“Na minha sala, no primeiro ano do ensino médio, eu era a única na turma que queria estudar. Eles punham fogo dentro da sala com todo mundo lá dentro. Era um inferno. Eu sofri muito. Há pouco tempo, eu estava pegando o ônibus e encontrei um desses meninos que tinham estudado comigo. Ele tinha acabado de fazer um assalto. Dá muita tristeza de ver que outras pessoas não tiveram a oportunidade que eu tive.”

FElipe Francisco

Os alunos do ProFIS quando entram na graduação trazem uma outra visão de mundo

Felipe Francisco

“Quando eu entrei na graduação, eu não podia só pensar em viver aqui. Eu tinha outras preocupações. Precisava ganhar dinheiro, manter minha bolsa, voltar para casa. Lembro do pessoal ficar bravo comigo porque eu não queria ir para as festas. Eu tinha pegar três ônibus para ir para casa. Eu não tinha disposição para festa. Os alunos que estudaram em escola particular a vida inteira, não têm nem ideia do que é uma escola pública. Lembro de discussões nas disciplinas de educação em que o pessoal achava que o maior problema do aluno escola pública era o vestibular. Muitas vezes o aluno da escola pública nem sabe que existe vestibular!”

TAlita Rodrigues

Onde estou com a cabeça de querer estudar?! A gente não tem dinheiro para viver!

Talita Rodrigues

“No final do meu segundo ano do ProFIS, meu pai sofreu um acidente no trabalho. Ele é açougueiro e tinha quase perdido um dos dedos. Ele teve que passar por várias cirurgias, pois havia rompido o tendão e corria o risco de perder os movimentos da mão. Meu pai teve que se afastar do emprego e até começar a receber o primeiro salário do INSS demorou mais de três meses. No mesmo período, eu entrei de férias. A bolsa do Profis tinha acabado e eu esperava começar o processo seletivo pelo SAE, para correr a bolsa com todos os alunos de graduação.

Minha mãe tem alguns problemas de saúde e desde que sofreu um AVC não conseguiu mais trabalhar. Eu tenho uma irmã mais nova do que eu e nessa fase ela só estava estudando. A gente ficou praticamente três meses sem renda nenhuma em casa. Foi muito difícil. A gente não tinha poupança. A gente não tinha bens, dos quais poderíamos abrir mão para auxiliar naquele momento. A gente recebeu ajuda da comunidade, de várias pessoas. E eu pensava: ‘Gente onde estou com a cabeça de querer estudar! Ainda um curso integral! Sendo que minha família agora está passando por essa situação!’ Ainda bem que eu não desisti.”

 “No início da graduação, na disciplina de saúde coletiva, começamos a fazer estágio em centros de saúde de bairros de Campinas. Íamos a bairros de periferia, que sofrem com problemas de vulnerabilidade social, tráfico de drogas, etc. Uma realidade que a gente que entrou pelo ProFIS já conhece, mas para resto da minha turma causava muito estranhamento. Eu lembro que, durante o trajeto, o pessoal ia ficando apavorado e iam se blindando para entrar naquele lugar. Eu ficava imaginando como meus colegas atenderiam pessoas como eu e minha família, que usam o serviço de saúde, com esse bloqueio.”

“Sempre estudei em escola pública. No ensino médio, estudava à noite e para trabalhar durante o dia. Minha chance de entrar em uma universidade pública pelo vestibular era muito pequena. Quando entrei no ProFIS vi aquilo como a oportunidade da minha vida."

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