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As idas e vindas nos caminhos entre África e Brasil

Livro reúne estudos nas áreas de linguística, história e literatura de países que têm o português como língua oficial

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Desde 2003, com a aprovação da lei 10.639, que estabelece a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura afro-brasileiras e africanas nas escolas, nos segmentos fundamental e médio, os professores vêm esbarrando numa série de obstáculos à concretização dessa diretriz. Entre eles está a resistência da própria sociedade, ainda marcada pelo racismo e pela intolerância religiosa. Outro ponto relevante é a formação desses profissionais, já que muitos deles nunca tiveram contato com esses temas.

Para suprir essa demanda, muitas universidades vêm promovendo estudos relacionados a esse campo de conhecimento, seja por meio da criação de novas disciplinas, da organização de eventos ou de grupos de pesquisa. Uma dessas iniciativas ocorreu em 2006, quando a Unicamp comemorou 40 anos de existência. Para compor as festividades foi realizado, no mês de novembro, o colóquio Caminhos da língua portuguesa, que visava discutir e examinar a relação entre o Brasil e os países africanos de língua portuguesa.

Em 2009, os estudos apresentados foram reunidos no livro África-Brasil: Caminhos da língua portuguesa, lançado pela Editora da Unicamp. A obra foi organizada pelos professores Charlotte Galves, do Departamento de Linguística, e Fernando Rosa Ribeiro, do Departamento de História, ambos da Unicamp, e pelo professor Helder Garmes, do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da USP.

O volume é composto por 16 artigos, com estudos nas áreas de linguística, história e literatura de países que possuem o português como língua oficial. A organização dos textos convida o leitor a percorrê-los: os primeiros artigos abordam os processos históricos de apropriação da língua portuguesa; os estudos de literatura enfatizam a importância desta para a criação de uma identidade nacional na África pós-colonial, e o último conjunto de textos mostra como as línguas africanas e o português se influenciam e atuam na era digital.

Um ponto bastante discutido é a importância das variações existentes nas línguas dos países colonizados pelos portugueses e como a palavra lusofonia, empregada para identificá-los, é problemática. Para a pesquisadora do Laboratório de Estudos Urbanos da Unicamp Eni Orlandi, o termo conservaria a ideia de homogeneidade e reforçaria a temática da colonização. “O Luso é o Português. E nada temos a ver com isso. Precisamos, com a descolonização, realçar nossa unidade em nossas diferenças: históricas, linguísticas, culturais, sociais, nacionais e de relações internacionais”, escreve no artigo “Processo de descolonização linguística: As representações da língua nacional”. Essa problemática também é abordada nos textos de Francisco Noa, Rita Chaves, Laura Cavalcanti Padilha e Maria Nazareth Soares Fonseca. Desse modo, os autores mostram que, mesmo utilizando o português como fonte de expressão e disseminação cultural, as literaturas produzidas por essas ex-colônias são diferentes, e a identidade de cada país é reafirmada por meio de sua literatura.

Para elucidar melhor essa ideia, um destaque da obra é o texto que a encerra, no qual o catedrático francês Michel Laban, especialista em literaturas africanas de língua portuguesa, media um bate-papo entre os autores moçambicanos Ana Mafalda Leite e João Paulo Borges Coelho. Nessa conversa, os três expõem como suas experiências pessoais se relacionam com a formação literária de países do continente africano. Além disso, os autores intercalam suas falas com declamações de trechos de suas obras. Essa entrevista híbrida desperta no leitor uma curiosidade não apenas pelos entrevistados, mas também por aquilo que eles escreveram.

Apesar de termos enfatizado aqui o campo dos estudos literários, trata-se, de modo geral, de uma coletânea bem completa, que envolve textos de áreas diversas e pesquisadores de várias partes do mundo na discussão de um tema que precisa ser cada vez mais disseminado, especialmente para o público docente. Dessa maneira, os professores poderão ampliar o seu conhecimento sobre as culturas africanas e apresentar para seus alunos novas formas de ver o mundo e as relações socioculturais, além das europeias e norte-americanas.


ReproduçãoSERVIÇO

Título: África-Brasil - Caminhos da língua portuguesa

Organizador: Charlotte Galves, Helder Garmes e Fernando Rosa Ribeiro.

ISBN: 978-85-268-0838-6

Edição: 1ª

Ano: 2009

Páginas: 280

Dimensões: 16 x 23 cm

R$ 50,00

 

 

 

Imagem de capa JU-online
Reprodução | Editora Unicamp

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